O corpo visto pelas perspectivas da arte é muito mais que um objeto. Ele é o que é e também o que não é, uma vez que pode ser visto sob uma ótica multifacetada. Ainda que soe vago, diversas palavras poderiam ajudar a nomear o corpo em sua possíveis representações metafóricas: testemunha, ilha, prisão, dispositivo orgânico, vida, sonhos, mídia, habitáculo, cofre, caixa, ponto, início, meio, fim, movimento, máquina do tempo, nave, casulo, sentimento, energia, indiferença, ódio e amor.
Com o intuito de refletir sobre o corpo que representa e vive um grande conjunto de experiências sensoriais, a fotografia se apresenta como ferramenta dinâmica e interessante. Com ela é possível congelar as expressões visíveis e mesmo desvelar aquilo que não pode ser visto, apenas sentido. Se estivermos encasulados em nosso próprio corpo e ele é nosso passaporte para deslocamentos sensoriais e temporais, a imagem poética de suas representações funciona como inventário da própria condição de viver.
Mas, se apenas ideia e sentimentos não são suficientes para fechar o jogo visual da representação do corpo, é importante buscar referências entre obras e artistas que tenham desbravado esses caminhos. Os artistas escolhidos por sua pesquisa e produção têm o tema em comum e também produziram imagens fotográficas ou sua obra foi intensamente fotografada. São eles:
– Man Ray Barbette Applying Makeup, 1926
– Nildo da Mangueira, com Parangolé, 1964
– Wilton Garcia com as obras Manuscriptum 1 (2000), Cicatriz 4 (2003), Annas 2 (2000), Âmbar 1 (2001) e Âmbar 4 (2001) [1]
No primeiro artista, o que chama atenção é o uso da fotografia para registrar o cuidado com o corpo e o julgamento do espelho, a busca pela perfeição para o encontro com o outro, com a própria vida. O uso de artifícios (maquilagem e adereços) não é suficiente para esconder a nudez da própria solidão, mas apesar disso nos mostra a riqueza de possibilidades complementares para estabelecer diálogos sociais e culturais pela imagem e suas representações.
Já o Parangolé traz a própria vida como realização própria, vai além da simples observação e se realiza pelo fazer, pelo vestir e pelo movimento, que ganha planos e rompe espaços ao levar o espectador (até então) a participar na realização da arte. É a vivência plena de uma explosão sensorial.
Por fim, o pesquisador e artista visual Dr. Wilton Garcia [2], nos faz pensar sobre outras possibilidades de leitura visual dos corpos fotografados. As imagens produzidas, borradas pela dinâmica dos movimentos corporais, se revelam como poesias de leitura visual que tratam de flexibilidade e deslocamento como alicerce para diferentes produções do conhecimento.
Tendo como ponto de partida as obras acima citadas a ideia foi criar uma apresentação com fotos pessoais que coloquem o corpo na mesma dimensão explorada, mas sem copiá-las, apenas servindo como estímulos para enveredar pelo mesmo desafio. A apresentação é valorizada pelo uso de trilha sonora e também pela movimentação de algumas cenas estáticas.
[1] http://www.fotografiacontemporanea.com.br/v07/artigo.asp?artigoId=3388D6
[2] É artista visual e pesquisador de cinema, fotografia, vídeo e imagem digital, desenvolvendo estudos sobre o corpo. Também é Dr. em Comunicação pela ECA/USP, Pós-Dr. em Multimeios pelo IA/UNICAMP e organizador do livro Corpo e subjetividade: estudos contemporâneos. (Factash, 2006), entre outros.
O resultado dessa pesquisa permitiu o desenvolvimento do vídeo que pode ser visto aqui: